Assis Valente é o autor da mais bela canção de Natal de todos os tempos. A mais bela e a mais triste também. “Eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel…”, diz um trecho da letra. Assis Valente compôs Boas Festas no dia 24 de dezembro de 1932. À época, o compositor baiano, então com 24 anos, ganhava a vida no Rio de Janeiro fazendo próteses dentárias. Quando sobrava tempo, compunha sambas e marchinhas.
A inspiração, conta o escritor Gonçalo Júnior na biografia Quem Samba Tem Alegria, veio do quadro de uma bailarina na parede do quarto de pensão onde ele morava em Niterói. Com saudade de casa, o sambista pegou uma folha em branco e começou a rabiscar os primeiros versos. De feliz, porém, a canção não tem nada. Boas Festas foi gravada em 1933 pelo cantor Carlos Galhardo e regravada ao longo dos anos por grandes nomes da MPB. Sentir-se triste no Natal, como Assis Valente em 1932, é mais do que normal.
É o que garantem os especialistas em saúde mental. “A data representa o fim de um ciclo e todo fim de ciclo gera tristeza”, afirma a neuropsicóloga Jô Alvim. “Nesta época, as pessoas gostam de fazer um balanço do ano que passou. O problema é que, na maioria das vezes, elas pensam mais nos projetos que não realizaram do que naqueles que conquistaram. Para piorar, alguns familiares não estarão presentes. Morreram, mudaram de cidade ou, no caso dos filhos, se casaram e vão comemorar com a família do cônjuge”.
No Brasil, a síndrome de fim de ano já ganhou até apelido: dezembrite, fusão da palavra “dezembro” com o sufixo “ite”, que significa inflamação aguda ou crônica. A dezembrite ainda não faz parte do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, na sigla em inglês), a “Bíblia da psiquiatria”, muito menos da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), cartilha que engloba quase 55 mil códigos, entre sintomas, lesões e anomalias. Mas, já existem estudos, no Brasil e no exterior, que ajudam a entender o tamanho do problema.